Wednesday, February 16, 2011

Review: The King's Speech (O Discurso do Rei)




Uma biopic. Histórica. Protagonizada pelos usual suspects. O que é que vai salvar este filme?

Parece quase impossível que um filme tão formulaico em papel resulte tão bem como este em filme; a resposta é fácil: a humildade com que o realizador fez este filme. Talvez por perceber que neste filme o verdadeiro desafio é garantir que o grandiosismo vem não dos eventos históricos que inevitavelmente são caracterizados de maneira tão fria, ou talvez por não sufocar o argumento que tudo tinha para, no clímax do filme, completar o ciclo de pretensiosismo típico em filmes do género. A verdade é que The King's Speech é tudo o que filmes como The Queen (segurado por um fio de nome Helen Mirren) e Nixon (um descarrilamento completo) não conseguiram ser: sólido, honesto e, acima de tudo, humilde.

A história é agradavelmente descomplicada: o Rei Jorge VI (Colin Firth) vê-se obrigado a enfrentar, finalmente, a sua gaguez, quando o dever monárquico lhe vem bater à porta. Para isso, a sua mulher (Helena Bonham-Carter) contacta um terapeuta da fala, Lionel (Geoffrey Rush), cujos métodos demasiado descontraídos pareciam ser precisamente o que o monarca precisava.

Sem perder qualquer tipo de ritmo, o filme leva-nos, com a ascensão de Hitler em paralelo, a dar um passeio junto da família real, no Reino Unido (com direito a Hyde Park e tudo) durante os anos 30, habilmente cobrindo várias facetas do guião, desde a vida pessoal de Lionel, aos atritos no seio da família real, até à pressão política que a invasão da Polónia pela Alemanha põe no monarca e a inevitável obrigação de fazer o discurso da sua carreira.

Tom Hooper é, sem dúvida, um génio no género histórico (veja-se o seu trabalho em televisão, Elizabeth I e John Adams). Seria demasiado fácil dar-lhe todo o crédito neste filme, já que a simplicidade da realização nos apanha desprevenidos no primeiro segundo e não mais nos larga, até que só na recta final do filme, aquando do início da Segunda Guerra Mundial, nos apercebemos do quão imersos estamos no enredo.

Também não seria justo atribuir o sucesso do filme ao trio de powerhouses reúnido. O Óscar de Melhor Actor Principal já está com o nome de Colin Firth gravado, mas a verdadeira luz do filme só podia vir da personagem de Geoffrey Rush. É um papel que faria uma carreira só por si, não fosse ele um dos grandes actores dos últimos vinte anos, mas a graciosidade e inteligência com que ele aproveita cada nicho deste terapeuta da fala é, no mínimo, espectacular. Por dedução, Helena Bonham-Carter teve o pauzinho mais pequeno, num papel recheado de wink-winks, provando, mais uma vez, que, apesar de ser sempre um prazer vê-la no ecrã, a actriz já se acomodou confortavelmente ao papel de "mulher do Tim Burton", independentemente do filme.

Será o guião a grande jóia deste filme? A classe e o bom gosto com que os momentos de comédia quase que marcam o ritmo do filme são a fundação do filme, e a gestão de 2 horas de filme para o crescimento da relação central entre o rei e o terapeuta é de aplaudir.

Pois, a questão acaba por ser, realmente, essa: não há nenhum "culpado". É um daqueles filmes que funciona. Tudo encaixa. Tudo é encarado com extrema intimidade, e talvez a única parte que acaba por não funcionar era o óbvio contraste quase "pedido" entre Hitler e o Jorge VI. Apesar de o filme dar suficiente liberdade ao espectador de se focar quer no aspecto histórico, biográfico ou íntimo do filme, inevitavelmente é a relação central que afoga tudo o resto, e algumas das intenções do guião e do realizador podem não ter tido efeito.

Mas é, no mínimo, refrescante assistir a um filme teoricamente tão frio que deixa espaço suficiente para as suas personagens crescerem. Tudo sobre o simples preceito de que muitas vezes, independentemente das funções que estamos destinados a fazer, os limites não estão na conjuntura em que vivemos, mas sim na falta de confiança à qual optamos por nos acomodar. De facto, não são as credenciais, instituições ou tradições que fazem o mérito.

É um bom filme, e um filme bom. Vejam e percebem o que eu quero dizer com esta analogia barata.

NOTA: 4.5/5

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